O novo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é uma incógnita para estudantes e professores baianos, que, além de contarem com um repaginado termômetro de aprendizado, serão apresentados ao primeiro vestibular unificado do País. Pelo menos até 3 de outubro. A pouco mais de cinco meses do exame, educadores se atêm ao dilema: preparar estudantes para uma prova que nem eles, professores, conhecem.
A adesão da Universidade Federal da Bahia (Ufba) só aumenta a expectativa. Há duas semanas, o reitor Naomar de Almeida Filho anunciou que, já no próximo ano, a Ufba terá o Enem como processo seletivo dos bacharelados interdisciplinares, e que em 2011 a novidade deve se estender aos cursos tradicionais.
Antes mesmo da aprovação do Consepe – conselho universitário formado por 48 membros, a quem caberá decidir se a universidade optará, ou não, pelo vestibular unificado –, o reitor adiantou detalhes como uma possível segunda fase anexada, elaborada pela Ufba. Entre pedagogos e diretores de escola, é unânime a necessidade de uma avaliação que exija conhecimento, raciocínio e interdisciplinaridade, fazendo frente ao atual “decoreba” a que se propõe a maioria dos vestibulares.
Até que se prove o contrário, esta é a proposta do novo Enem, que avaliará os estudantes em maior tempo (dois dias ao invés de um) e propõe uma maratona de 200 questões, contra as 63 das edições anteriores. Fora, decoreba – “O maior problema da Ufba, hoje, é a quantidade de conteúdo exigida. Quanto mais assuntos, menos você tem condições de aprofundar o ensino”, avalia Paulo Rocha, diretor do Colégio Integral, que julga desnecessária a absorção de informações as quais “o estudante decora e joga fora depois da prova”. Para o educador, que coordena turmas de ensino médio e cursinho, a mudança é positiva também porque distancia do Enem o estigma de prova de autoavaliação.
De fato, com o vestibular unificado findará a exaustiva maratona imposta por cursinhos, onde chegam às dezenas o número de módulos e aulas especiais voltadas para este ou aquele vestibular. Mas nem todos concordam que ele trará menos sobrecarga. “Não pense que fazer uma prova que exige mais competências seja mais fácil. Nós vamos ter mais trabalho para preparar os estudantes, desenvolver habilidades diferentes”, adverte Lurdinha Viana, diretora do Colégio Oficina.
À frente de turmas de cursinho e 3° ano, Lurdinha e outros tantos educadores têm o desafio de estrear – e certamente “adivinhar” – o novo modelo de avaliação. “Há muitas perguntas que o projeto ainda não responde, e a minha é: a Ufba vai promover seminários de formação para que escolas públicas e privadas conheçam o novo processo seletivo?”, questiona, enquanto vislumbra a rede pública em desvantagem na corrida pelo melhor preparo. Corrida – A professora Lurdinha explica que os alunos do Oficina – 2° colocado de Salvador no Enem 2007 – serão treinados sob a “matemática” do raciocínio versus tempo, já que resolverão 100 proposições por dia, além de redação. Sabe-se que as questões podem exigir conhecimento de uma, duas ou três disciplinas diferentes, e que a prova, elaborada pelo Instituto Nacional de Ensino e Pesquisas Educacionais (Inep), supõe uma linha de raciocínio mais próxima do que já é aplicado no Sudeste do País. Conteúdos regionais, em disciplinas como história ou literatura, não serão mais pauta do pré-vestibular. “Eu considero uma perda, mas não acredito nesta proposta como um modelo definitivo e pronto, até porque ainda está em discussão. Não deveria ser travado apenas no plano político, dos reitores e ministérios. Não nos esqueçamos que a proposta parte de entidades do Sudeste, dentro de um país com uma diversidade cultural como a nossa”, diz a professora. Dúvidas – O primeiro avanço do Inep em esclarecer dúvidas restringiu-se, pelo menos em Salvador, à Reitoria da Ufba, onde há uma semana foi apresentado o seu modelo de vestibular unificado ao Consepe.
Nas esferas do ensino médio, dúvidas pairam sobre cabeças angustiadas: matemática e biologia estarão na prova, certamente. Mas como saber se trigonometria, taxonomia ou biologia molecular são assuntos que merecem ser revisados?
“Tudo ainda é nebuloso; para nós, o projeto ainda não está muito claro”, avalia Telma Barreto, diretora do Colégio São Paulo. Ela se diz tranquila por um detalhe: a maioria de seus alunos não optará pelos bacharelados interdisciplinares, o que lhe dá uma “folga” de mais um ano até o exame ser testado. “Mas a proposta é positiva, até porque não tira a autonomia das universidades”.
Dentre o emaranhado de perguntas sem respostas, uma certeza. A de que o vestibular não acabou, apenas mudou de nome e conceito. Continuarão no topo os alunos melhor preparados, e nas universidades de excelência, aqueles que vieram de boas escolas. Só a concorrência sofrerá algum impacto: em tese, porque para os melhores cursos, concorre o Brasil inteiro.
Fonte: A Tarde
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